A família Baraça: Um Saber de Gerações
A Família Baraça
A família “Baraça” é uma das mais tradicionais e conceituadas do universo do Figurado de Barcelos.

A alcunha “Baraça” surge do casamento de Ana Lopes Gonçalves (Ana Baraça) com Manuel Pereira. O marido desta conceituada artesã, quando era solteiro, tocava viola nas romarias das freguesias, instrumento que decorava com, “baraças” (tiras em tecido) que ficavam penduradas e chamavam a atenção. Por outro lado, usava uma “baraça” nas calças, no lugar de um cinto. O apelido deste barrista “pegou” e, indexado ao nome da sua esposa Ana, consagrou-se no artesanato português, ficando assim conhecida esta família como os “Baraças”.

Porém, a tradição barrista desta família já é anterior a este casamento de Ana Baraça com Manuel Pereira. Podemos comprovar esta constatação com a referência a Manuel Valada, pai de Ana Baraça, nascido em 1880, que foi um dos grandes barristas do seu tempo. Contudo, foi com a sua filha, nascida em 26 de Maio de 1904, que a arte e mestria desta família se projecta para os arautos da arte popular portuguesa.

Ana Baraça

Uma vida “feita de barro”

Ana Lopes Gonçalves Valada, vulgo Ana Baraça, nasceu, em Galegos Santa Maria, a 26 de Maio de 1904.

Filha de Manuel Valada e Luísa Lopes, memoráveis artesãos deste concelho, começou a fazer “bonecos” muito cedo. Com sete anos fez as primeiras peças, principalmente galinhos, e aos 15 já colocava as suas próprias criações no forno do pai. Na feira de Barcelos, juntamente com os seus pais, vendia o pequeno e modesto figurado a 10 réis cada peça.

Devido às dificuldades económicas viu-se, temporariamente, afastada do barro quando foi servir na lavoura, até aos dezassete anos. Esta razão influenciou bastante as temáticas e estéticas que, mais tarde, utilizou nas suas criações.

Casou, a 28 de Maio de 1935, com Manuel Pereira, também ele oleiro e rodista. Depois de casada, dedicou-se à feitura de galos, durante cinco anos, que pintava cautelosamente com a ponta de um prego, método que manteve em segredo bastante tempo. Após um parto complicado, que a deixou com a saúde debilitada, abandonou a produção de galos e retomou, definitivamente, o figurado. Tornou-se uma das maiores criadoras deste tipo de artesanato na região com peças, essencialmente, ligadas à agricultura, tais como juntas e carros de bois e arados.

Ana Baraça Ana Baraça
[1904 – 2001]

Modelava tudo o que a rodeava, de uma forma terna, mas carregada de simbolismo e expressão única. Os seus métodos de trabalho eram puramente artesanais e de uma grande singeleza. O barro tratado manualmente com a enxada, a criação das figuras feitas à mão, sem a ajuda de qualquer molde, o forno de cozedura bastante primitivo, em pedra e a lenha, a veracidade das suas pinturas manuais, muito coloridas e atractivas, foram elementos que caracterizaram a arte desta artesã.

Figura tutelar e referência artística do artesanato barcelense, Ana “Baraça”, a 8 de Março de 1985, com 81 anos, foi condecorada pelo Presidente da República com o grau de Oficial da Ordem do Infante Dom Henrique, em homenagem à sua vida e obra artística. Ana “Baraça” era uma mulher alegre, com um sorriso permanente, irradiadora de uma confiança e autonomia incrível.

Faleceu, a 27 de Março de 2001, com quase 97 anos, deixando para trás uma vida “feita de barro”. Deu a vida ao figurado de Barcelos uma projecção única, só comparável à acção de Rosa “Ramalho” e Rosa “Côta”.

A criatividade e simplicidade desta mulher do povo, campestre e humilde, marcaram uma expressão artística muito própria, ainda hoje referencial numa das famílias consagradas da arte popular – os “Baraças”, nome que ela própria imortalizou e legou ao artesanato local.

Fernando Baraça
Felizmente, a arte e o saber de Ana Baraça não partiu com ela. O seu saber foi transmitido ao seu filho Fernando Gonçalves Pereira “Baraça”, que também se iniciou na arte desde pequenino. A paixão pelo barro, associada às precárias condições económicas da família, levaram-no a dedicar-se totalmente à feitura de artesanato sendo ele o “mestre” da roda. Os trabalhos que elabora têm uma nítida influência na arte da mãe, mormente as peças ligadas ao mundo rural, à agricultura e à pecuária: os carros de bois, os camponeses, os arados, as juntam de bois, entre outras. Já o seu cunho pessoal fica expresso sobretudo nos coretos e nas bandas de música.

Os Irmãos Baraça
Os três filhos de Fernando, Carlos, Vitor e Moisés “Baraça”, também comungam da mesma paixão e arte da família.

Hoje são os Irmãos Baraça, Vítor e Moisés, a dar continuidade à obra iniciada pela avó Ana Baraça. Foi com ela que, desde muito jovens, deram os primeiros passos no ofício e assim progrediram com a sua marca.

Têm experimentado novas técnicas, feitios e temáticas, desenvolvendo traços identitários próprios e unicos. Continuam e continuaram, porém, fiéis ao estilo da “mestre” Ana Baraça.